12 setembro 2009

A janela e a novela


Na internet, em um desses grandes portais, no meio de um mosaico de notícias e manchetes leio algo dizendo que Manoel Carlos compara sua próxima novela com 'Janela indiscreta', do Hitchcock. O troço me chama a atenção pela comparação que já julgo descabida mesmo antes de saber do que se trata. E é mesmo descabida. Na verdade, o autor somente dizia que se via como o protagonista do filme, desvendando e bisbilhotando a vida de seus vizinhos, em seu caso, os personagens da novela.

Mais abaixo no texto, há um resumo de cada um dos personagens. Nem mesmo sei se é um resumo ou se eles são aquilo ali mesmo. Acho que no caso de pergonagens de uma novela das oito (que vai ao ar às nove), eles são aquilo ali mesmo. No decorrer da trama alguns vão ser alguma coisa a mais, outros, serão o que sempre foram e ainda, terceiros, patéticos, serão algo a menos do que eram no início. Só estarão ali fazendo cena.
Eis um exemplo do que estava no texto:

Quem é quem em "Viver a Vida"
Oswaldo (Laércio de Freitas) - Pai de Helena, vive em Búzios, onde toca piano nas noites para se sustentar.
Edite (Lica Oliveira) - Mãe de Helena, divorciou-se, mas mantém boa relação com o ex-marido.
Sandra (Aparecida Petrowky) - Irmã de Helena e Paulo, vive se metendo em confusão. Mora no Rio de Janeiro e passa temporadas na casa da irmã. Namora Benê, um marginal.
Paulo (Michel Gomes) - Irmão caçula de Helena, vive com a mãe em Búzios. Tem um romance com Soraia.
Benê (Marcello Melo) - Namorado de Sandra, é mau-caráter e está sempre envolvido com as pessoas erradas.
Fiquei imaginando se a gente fizesse resumos de nós mesmos. Nesses mesmos termos. Detalhes de nós mesmos, uma descrição pessoal que só seria relevante se a gente vivesse em uma novela.

Um teste:

Pablo – Casado com Marina, é um jornalista que sonha em acertar na loteria.
Mas desse mesmo jeito há várias possibilidades de descrição. Todas superficiais. Superficiais como essas descrições que nos solicitam na internet. Em blogs, orkuts, twitters, facebooks, sempre nos perguntam quem somos. E sempre tenho uma baita dificuldade em responder. Prefiro não colocar nada, ou então, algo mais subjetivo. Não porque eu não saiba quem eu sou, mas porque tenho profunda rejeição em me rotular. Ou, melhor ainda, me reduzir. Porque reduzidos já somos todos, pelos outros. Cada um que já conheci nessa vida tem um resumo próprio do que eu sou. Nesse caso vale a comparação com James Stewart e sua luneta que bisbilhota os vizinhos no prédio em frente ao seu. Ele vê apenas uma encenação muda, enquadrada na dimensão da janela, que serve de palco. Nada mais do que isso. Qualquer julgamento ou compreensão de quem são os personagens do outro lado, fica por conta de quem está do lado de cá. O autor noveleiro da vida alheia. A obra completa só nós conhecemos.